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23 de Julho de 2019

Crédito após pedido de recuperação deve ir ao quadro geral de credores, diz STJ

O crédito oriundo de condenação trabalhista imposta após o pedido de recuperação judicial da empresa deve ser inscrito no quadro geral de credores da empresa. O entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. O acórdão é do dia 16/5.  Na ação, prevaleceu entendimento da relatora, ministra Nancy Andrighi. Ela levou em consideração o artigo 49 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas (LFRE), que diz que o crédito trabalhista não se constitui na decisão judicial que o reconhece, mas na própria prestação laboral. Por isso, deve passar a integrar a lista de credores, em vez de ser pago imediatamente ao trabalhador. "Tratando-se, como na espécie, de vínculo jurídico decorrente de relação de trabalho, a constituição do crédito correspondente não se dá com a prolação da decisão judicial que o reconhece e o quantifica, mas desde a prestação da atividade laboral", diz.  Segundo a ministra, a LFRE determina que, quando se tratar de ação sobre quantia ilíquida, cujo processamento não é suspenso pelo pedido de recuperação, o crédito decorrente da sentença deve ser incluído no quadro geral de credores, podendo o juízo onde ela tramita, inclusive, determinar a reserva de valor para a satisfação da obrigação, conforme preceitua o artigo 6º, parágrafos 1º e 3º. "Especificamente acerca do crédito derivado de relação de trabalho, o parágrafo 2º do mesmo dispositivo estabelece que deve ele ser inscrito no quadro geral de credores pelo valor apurado na sentença proferida pela Justiça especializada, facultando-se ao credor, inclusive, pleitear sua habilitação diretamente perante o administrador judicial", afirma.  Recurso O colegiado analisou um recurso de uma ação de recuperação judicial de uma empresa de vigilância. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tinha negado o pedido de habilitação de crédito estabelecido por sentença trabalhista, formulado por um dos empregados, sob o fundamento de que tal crédito teria sido reconhecido judicialmente somente após o início da recuperação. No recurso apresentado ao STJ, o empregado sustentou que o crédito trabalhista pleiteado já existia na data do pedido de recuperação judicial, tendo ocorrido apenas seu reconhecimento, em momento posterior, pelo juízo trabalhista. Acrescentou, ainda, que a habilitação pretendida é objeto de concordância por parte do credor, da empresa em recuperação e do administrador judicial – o que demonstra que o acolhimento do pedido não causaria prejuízo à preservação da empresa. RESp 1.721.993   Autor: Gabirela Coelho Fonte: Conjur  

16 de Julho de 2019

A desconsideração da pessoa jurídica no redirecionamento de execuções fiscais

O artigo 135, III, do CTN trata das hipóteses em que excepcionalmente a autonomia do patrimônio das pessoas jurídicas é relativizada para permitir a responsabilização pessoal de sócios por débitos tributários das empresas decorrentes de atos praticados (i) com abuso de poder, (ii) que configurem infração à lei ou (iii) ao contrato/estatuto social. Como o dispositivo aparentemente estabelece — nas hipóteses em que especifica — uma espécie de responsabilização “automática” dos sócios administradores, o STJ passou a autorizar o chamado “redirecionamento” da execução fiscal contra esses “terceiros”. Nesse contexto, a doutrina e a jurisprudência consolidaram-se no sentido de que não se trata de desconsideração de personalidade jurídica propriamente dita, de modo que bastaria mero requerimento, via petição intercorrente, de inclusão dos corresponsáveis no polo passivo da ação exacional. Segundo Heleno Torres, “quanto aos demais dispositivos do Código Tributário Nacional, queremos evidenciar que os art. 124 e 135, em nenhuma circunstância, têm o condão de permitir formas de desconsideração da personalidade jurídica, como pensam alguns. (...) Este artigo 135, portanto, contempla regra que se aplica à relação jurídica formada entre as pessoas indicadas e os que sofrem qualquer consequência patrimonial decorrente de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, tão só. (...). Nada tem que ver com ‘desconsideração da personalidade jurídica’ (...)”. É justamente nesse sentido o entendimento pacífico do STJ, como ilustra o seguinte julgado:   “REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. (...) INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DESNECESSIDADE. (...) (...) V - Evidenciadas as situações previstas nos arts. 124, 133 e 135, todos do CTN, não se apresenta impositiva a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, podendo o julgador determinar diretamente o redirecionamento da execução fiscal para responsabilizar a sociedade na sucessão empresarial. (...)”.   Situação juridicamente diversa ocorre quando o Fisco requerer a inclusão de sócio administrador no polo passivo de execução fiscal sob a alegação de formação de grupo econômico gerido mediante abuso de personalidade jurídica, desvio de finalidade ou confusão patrimonial — o que, em tese, autoriza a desconsideração da personalidade jurídica da devedora originária para atingir os bens particulares do responsável, com fundamento no abaixo transcrito artigo 50 do Código Civil.   “Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.   Com o advento do CPC/2015, essa desconsideração de personalidade jurídica deve ser discutida em incidente processual próprio que garanta aos sócios administradores o prévio exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa. É exatamente o que dispõem os artigos 133 e 135 do citado diploma:   “Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo. § 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei”. “Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias”.   E não poderia ser diferente, afinal, a melhor cautela processual recomenda que as discussões acessórias ao objeto central da lide sejam instrumentalizadas via incidente, a fim de evitar eventual prejuízo à análise do mérito. Ademais, o próprio artigo 795, parágrafo 4º, do CPC é categórico ao obrigar a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica para a responsabilização dos sócios por dívidas contraídas por suas empresas:   “Art. 795. Os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, senão nos casos previstos em lei. (...) § 4º Para a desconsideração da personalidade jurídica É OBRIGATÓRIA A OBSERVÂNCIA DO INCIDENTE previsto neste Código”. (grifamos)   O caput do artigo 134 do novo código ainda prevê que o incidente também é aplicável às execuções de título extrajudicial:   “Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial”. (grifamos)   Acerca da compatibilidade procedimental do incidente de desconsideração da personalidade jurídica com as execuções fiscais, assevera James Marins:   “Segundo pensamos, o incidente previsto nos artigos 133 e seguintes do CPC pode ser perfeitamente aplicado às execuções fiscais. Em primeiro lugar porque o instituto contribui para evitar a permanência de prática que conspira contra o due process of law ao permitir que cidadãos sejam executados sem que nunca tenham tido a oportunidade de defesa, administrativa ou judicial. Em segundo, porque a divergência sobre a natureza da responsabilidade em tela não impede a aplicação do instituto processual no âmbito fiscal, pois seu componente material não é obstáculo para que seja aplicado, mutatis mutandis, o incidente de processo que corrige o grave erro consistente na promoção da gravosa execução sem título”.   Por sua vez, a Fazenda Nacional invoca o critério da especialidade para sustentar que (i) o codex processual apenas é aplicável subsidiariamente ao processo executivo fiscal (artigo 1º da Lei 6.830/80) e que (ii) o artigo 133, parágrafo 4º, do CPC atribuiu ao incidente de desconsideração da personalidade jurídica eficácia suspensiva teoricamente incompatível com a LEF. Todavia, trata-se de uma causa suspensiva “mitigada” pois, em paralelo, o CPC trouxe mecanismos que asseguram o resultado útil do processo enquanto o incidente é processado e julgado, como a previsão expressa de que “a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar” (artigo 792, parágrafo 3º). Ademais, diante das alterações promovidas pela Lei 11.382/06, que introduziu o artigo 739-A ao então vigente CPC de 1973, o STJ decidiu privilegiar a interpretação sistemática para aplicá-lo às execuções fiscais, exigindo a demonstração da “relevância dos fundamentos” e do risco de “grave dano de difícil ou incerta reparação” para a atribuição de efeito suspensivo aos embargos (Recurso Repetitivo 1.272.827/PE). Lembramos que a Lei 6.830/80 somente exige a garantia do juízo como condição de procedibilidade dos embargos (artigo 16, parágrafo 1º) e que, até o advento da Lei 11.382/06, era pacífico que o mero recebimento de tal ação tinha o condão de sobrestar o curso do feito executivo justamente por força da redação do artigo 739, parágrafo 1º, do CPC de 1973 dada pela Lei 8.953/94. Ou seja, diante da aparente lacuna da LEF quanto aos efeitos dos embargos, o STJ já teve o ensejo de aplicar às execuções fiscais causa suspensiva extraída do CPC, inclusive impondo aos contribuintes requisitos — também previstos no diploma de ritos — adicionais à garantia do juízo. Analisando todo esse cenário jurídico-normativo, a 1ª Turma do STJ decidiu recentemente — nos autos do Recurso Especial 1.775.269/PR, relatado pelo ministro Gurgel — que se torna obrigatória a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica se o requerimento de redirecionamento do executivo fiscal mascarar verdadeiro pedido de desconsideração de personalidade jurídica fundamentado no artigo 50 do Código Civil. Transcrevemos a ementa desse relevantíssimo precedente:   “PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO A PESSOA JURÍDICA. GRUPO ECONÔMICO ‘DE FATO’. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADEJURÍDICA. CASO CONCRETO. NECESSIDADE. 1. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 133 do CPC/2015) não se instaura no processo executivo fiscal nos casos em que a Fazenda exequente pretende alcançar pessoa jurídica distinta daquela contra a qual, originalmente, foi ajuizada a execução, mas cujo nome consta na Certidão de Dívida Ativa, após regular procedimento administrativo, ou, mesmo o nome não estando no título executivo, o fisco demonstre a responsabilidade, na qualidade de terceiro, em consonância com os artigos 134 e 135 do CTN. (...) (...) 3. O redirecionamento de execução fiscal a pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento (nome na CDA) ou que não se enquadra nas hipóteses dos arts. 134 e 135 do CTN, depende da comprovação do abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, tal como consta do art. 50 do Código Civil, daí porque, nesse caso, é necessária a instauração do incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica devedora. 4. Hipótese em que o TRF4, na vigência do CPC/2015, preocupou-se em aferir os elementos que entendeu necessários à caracterização, de fato, do grupo econômico e, entendendo presentes, concluiu pela solidariedade das pessoas jurídicas, fazendo menção à legislação trabalhista e à Lei n. 8.212/1991, dispensando a instauração do incidente, por compreendê-lo incabível nas execuções fiscais, decisão que merece ser cassada”. (grifamos)   Conforme se depreende do último item da ementa, a turma reconheceu expressamente que a sistemática do incidente de desconsideração da personalidade jurídica é compatível com o rito da execução fiscal. Além disso, o relator, ministro Gurgel de Faria, cujo voto foi acompanhado por todos os seus pares, distinguiu de maneira cartesiana o redirecionamento de execução contra os sócios administradores, baseado no artigo 135 do CTN, e a desconsideração da personalidade jurídica com espeque no artigo 50 do Código Civil, em virtude do reconhecimento de grupo econômico. Destacamos o seguinte trecho do voto condutor:   “A atribuição de responsabilidade tributária aos sócios gerentes, nos termos do art. 135 do Código Tributário Nacional, não depende mesmo do incidente de desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária prevista no art. 133 do CPC/2015, pois a responsabilidade dos sócios, de fato, já lhes é atribuída pela própria lei, de forma pessoal e subjetiva. (...) Igualmente, a responsabilidade subsidiária do art. 134, VII, do CTN autoriza o redirecionamento da execução fiscal aos sócios na hipótese de não ser possível exigir o crédito tributário da sociedade empresária liquidada. Nesses casos, como afirmado, não há necessidade de desconsiderar a personalidade da pessoa jurídica devedora, pois a legislação, estabelecendo previamente a responsabilidade tributária do terceiro, permite a cobrança do crédito tributário diretamente dos terceiros que elenca. Porém, essa conclusão não é adequada quando a pretensão fazendária de redirecionamento mira pessoa jurídica integrante do mesmo grupo econômico a que pertence a sociedade empresária originalmente executada, que não está indicada na Certidão de Dívida Ativa e à qual não é atribuída a responsabilidade, na qualidade de terceiro (arts. 134 e 135 do CTN)”. (grifamos)   A partir dessa diferenciação, o relator concluiu que “sem a indicação da pessoa jurídica no ato de lançamento, ou sendo inexistentes as hipóteses dos arts. 134 e 135 do CTN, a imputação da responsabilidade ao grupo econômico ou à pessoa jurídica dele integrante dependerá da desconsideração da personalidade jurídica, cujo reconhecimento somentepode ser obtido com a instauração do referido incidente (art. 133 do CPC/2015)” (grifamos). Mais recentemente, a 1ª Turma ratificou esse posicionamento, ao julgar o Agravo em Recurso Especial 1.173.201/SC, igualmente relatado pelo ministro Gurgel de Faria. Como se não bastasse, o II Fórum Nacional de Execução Fiscal promovido pela Ajufe aprovou o seguinte enunciado sobre o tema:   “Enunciado n.º 21: O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto no art. 133 do NCPC, é aplicável aos casos em que há pedido de redirecionamento da execução fiscal da dívida ativa, com fundamento na configuração de grupo econômico, ou seja, nas hipóteses do art. 50 do CC”.   Por fim, ambas as turmas de Direito Privado do STJ possuem entendimento de que a desconsideração da personalidade jurídica, decorrente do reconhecimento de grupo econômico, na forma do artigo 50 do Código Civil, depende da instauração do incidente. Após o julgamento do Recurso Especial 1.775.269/PR, a Procuradoria da Fazenda Nacional opôs embargos de divergência, já distribuídos à 1ª Seção do STJ sob a relatoria da ministra Assusete Magalhães. No julgamento dos referidos embargos, a seção terá a oportunidade de estabelecer um corte jurisprudencial lógico diferenciando o redirecionamento de execução fiscal contra sócio administrador em decorrência da imputação de responsabilidade tributária da desconsideração da personalidade jurídica com fundamento no Código Civil, em virtude do reconhecimento de grupo econômico, que, à luz do CPC, inequivocamente exige instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica.   Autor: Leonel Pittzer Fonte: Conjur  

12 de Julho de 2019

Juiz trabalhista deve fundamentar decisão que reconhece grupo econômico

Recentemente, o TST consignou que a mera existência de sócios em comum não caracteriza grupo econômico para fins de responsabilidade solidária em condenações trabalhistas. Na origem, o TRT-2 tinha mantido a decisão de 1º grau por entender que a identidade societária e o fato de as empresas possuírem o mesmo endereço bastariam para essa caracterização. O TST afastou a condenação de empresa por violação ao artigo 2º, parágrafo 2º, da CLT, aplicando a jurisprudência pacífica da corte, que preconiza a necessidade de comprovação da relação hierárquica entre as sociedades ou efetivo controle exercido por uma delas. Embora já se pudesse verificar certa inclinação para a concentração no final do século XIX, os grupos econômicos efetivamente surgiram no século XX, com maior força após a Segunda Guerra Mundial, a partir de movimento voltado à gestão da produtividade e redução dos custos. As sociedades iniciaram um processo de reorganização em macroestruturas, porque as antigas estruturas societárias, pautadas nos modelos anteriores, tornaram-se obsoletas e insuficientes para atender às novas demandas. Os estudiosos da área explicam que os grupos econômicos se caracterizam precipuamente pela organização verticalizada e pela unidade de controle e política de administração, de sorte que, embora independentes, as sociedades controladas se subordinam ao poder de direção das atividades exercido pela sociedade controladora. Conforme o artigo 265 da Lei 6.404/76, a caracterização de grupo econômico exige ter havido convenção entre a controladora e as controladas, de modo que fiquem compelidas a combinar recursos ou esforços para a realização dos respectivos objetivos ou a participar das atividades ou empreendimentos comuns. A reforma trabalhista (Lei 13.647/17) modificou a redação do artigo 2º, parágrafo 2º, da CLT, com o objetivo de adequar o texto legal ao entendimento pacificado do TST relativamente ao conceito e caracterização do grupo econômico. Embora o tribunal superior já houvesse fixado entendimento sobre o tema, perdurava a divergência doutrinária e jurisprudencial (no âmbito das instâncias ordinárias). Na emenda aditiva que incluiu o dispositivo no projeto de lei, esclareceu-se ser a inserção imprescindível para garantir segurança jurídica aos indivíduos, substituindo-se a redação duvidosa do texto original por uma compatível com a orientação do TST. A intenção do legislador foi, portanto, incorporar no texto legal esse entendimento, acrescentando ainda o parágrafo 3º, que impõe a necessidade de comprovação do efetivo controle de uma empresa sobre as demais, com o explícito propósito de garantir maior segurança jurídica nas relações trabalhistas. Apesar da elucidação acerca dos elementos identificadores dos grupos econômicos, ainda existe resistência quanto a esse fenômeno, como pudemos ver na decisão do TRT-2 (e em diversas outras proferidas nessa e nas demais regiões). Como bem alertou o deputado Daniel Vilela no texto da citada emenda, situações como essa desencorajam o empreendedorismo, inibindo que o indivíduo seja sócio em mais de uma sociedade do mesmo setor. Mas, além disso, há outros pontos, em matéria processual, que devem ser objeto de reflexão. Significa trazer à tona a imprescindibilidade de vasta produção probatória, porque a caracterização (ou não) do grupo econômico precisa ser verificada em cada caso, a partir do exame minucioso das provas, e não com base em evidências genéricas, sob pena de excessiva e indevida abstração. O ônus de provar a existência de grupo econômico, destaque-se, é atribuído ao reclamante, que deve alegá-la em sua petição para fundamentar o pedido de responsabilidade solidária entre as empresas. E há, ainda, as tópicas do contraditório e da aplicação da regra da fundamentação das decisões judiciais. As disposições do Código de Processo Civil, nos termos do seu artigo 15 e do artigo 769 da CLT, aplicam-se supletiva e subsidiariamente aos processos trabalhistas. De todo modo, as regras aqui veiculadas são, na verdade, delineamentos de normas constitucionais, aplicando-se ao processo trabalhista independentemente da orientação dos referidos dispositivos. O legislador do CPC/2015 redesenhou o princípio do contraditório, estabelecendo verdadeiro dever de diálogo entre o juiz e as partes. E trouxe, no parágrafo 1º do artigo 489, um roteiro a ser seguido pelo juiz para que a decisão possa ser considerada fundamentada, como corolário do próprio contraditório, uma vez que este somente se realiza quando cumprido o dever de fundamentação. Ao entender pela caracterização do grupo econômico, portanto, é preciso que o julgador demonstre todo o caminho mental percorrido para ter chegado à conclusão a que chegou, observando, em cada caso, a efetiva presença dos elementos legalmente estabelecidos para reconhecimento do fenômeno. O desejo de encontrar quem tenha condições de pagar o valor da condenação não pode ser o motor da aplicação da lei.   Autor: Luiz Henrique Wambier, Mauri Bevervanço e Tatiana Giffoni Fonte: Conjur

10 de Julho de 2019

A responsabilidade tributária de grupos econômicos de fato

A coluna de hoje pretende abordar um tema bastante espinhoso e cuja discussão, embora recorrente no âmbito da 3ª Seção do Carf, também é alvo de calorosos debates nas demais seções daquele tribunal administrativo. Trata-se da discussão acerca do conceito de “interesse comum” para fins de responsabilização tributária de grupos econômicos de fato. É muito comum, em certas autuações fiscais, verificar-se a responsabilização de diferentes pessoas jurídicas ao fundamento de existir um grupo econômico de fato e, por conseguinte, um “interesse comum” entre tais pessoas na realização do fato gerador que enseja a correlata autuação. Em regra, sob uma perspectiva normativa, tais exigências costumam se fundamentar no disposto no artigo 124, inciso I do Código Tributário Nacional. A partir deste marco, a discussão comumente travada nos recursos que chegam ao Carf é no sentido de delimitar a extensão semântica da expressão “interesse comum”, ou seja, se para fins de incidência do aludido dispositivo bastaria a existência de um interesse econômico ou se, em verdade, haveria a exigência de um interesse jurídico a fundamentar a citada responsabilização. Pois bem. Na 3ª Seção do tribunal, o Acórdão Carf 9303­-008.391, da Câmara Superior de Recursos Fiscais, dá a tônica da discussão. Embora tenha tratado de responsabilidade tributária de pessoa física com o fito de afastá-la no caso em concreto, aquele colegiado, por unanimidade de votos, prescreveu que naquele específico caso não haveria elementos para comprovar que ele tinha interesse comum na situação que constitua a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, pois não há provas de que ele se beneficiava dos resultados auferidos ou que participava dos lucros decorrentes das operações irregulares, caracterizadas como sonegação fiscal. Do trecho alhures transcrito, resta claro que, para aludido colegiado, o conceito de interesse comum está relacionado com a ideia de interesse econômico, haja vista que o elemento fundamental para delimitar a ratio do julgado foi no sentido de o responsabilizado não auferir vantagens econômicas com a prática do fato gerador realizado pelo contribuinte. No âmbito da 1ª Seção é exemplar o Acórdão Carf 1301­-003.472. Neste caso em particular, o relator deixou expressamente consignado que o conceito de “interesse comum” não é equivalente ao de interesse econômico, bem como que o simples fato de pessoas integrarem o mesmo grupo econômico, por si só, não é suficiente para a responsabilização solidária. Conclui, ainda, que para que haja o citado interesse comum é necessário a configuração de uma das duas hipóteses a seguir: (i) a existência de um interesse direto e não meramente reflexo na prática do fato gerador, o que acontece quando as pessoas atuam em comum na situação que constitui o fato imponível; e, ainda (ii) quando há um interesse indireto na prática do fato gerador, mas desde que (ii.i) reste configurada a existência de uma confusão patrimonial; e/ou (ii.ii) fique provado o benefício do responsabilizado em razão da existência de fraude, sonegação ou conluio. No caso mencionado acima, o colegiado, por maioria de votos, entendeu que haveria o interesse comum em razão da configuração de uma fraude, na medida em que teria restado provado que a empresa responsabilizada teria atuado como intermediária em um esquema para a emissão de notas frias, emissões essas incompatíveis com a estrutura operacional da responsabilizada. Interessante destacar que o voto dissidente, objeto de declaração, não diverge das questões conceituais desenvolvidas pelo relator, mas conclui em sentido diametralmente oposto apenas por não coadunar com a qualificação jurídica atribuída as provas do caso, na medida em que entendeu pela inexistência da referida fraude. Também é bastante interessante o Acórdão Carf 1402­-002.511. Aqui o colegiado, por maioria de votos, afastou a acusação de grupo econômico e, por conseguinte, de interesse comum para fins de responsabilidade tributária ao fundamento que para ocorrer a responsabilização solidária prevista no artigo 124 do CTN é necessária a constatação e a prova da participação conjunta de pessoas, como referido na sua redação, quando da ocorrência do fato gerador, devendo serem estas diretos co-partícipes das infrações percebidas pelo Fisco. Em suma, referido voto parte da premissa que o interesse apto a ensejar a responsabilização tributária não é o meramente econômico, mas é aquele de viés jurídico, o que se configura com a partilha do mesmo fato gerador do tributo pelos diferentes sujeitos passivos, o que está em sintonia com a tradicional doutrina para o tema. Aludido voto deixa claro que, embora no caso em questão havia uma nítida “relação de controle, dentro de um inegável ambiente de grupo empresarial”, o que, ainda conforme destacado no voto, poderia até implicar a eventual configuração de uma confusão patrimonial entre as empresas autuadas, mas que tal fato, per se, não se enquadraria no tipo do artigo 124, inciso I do CTN. Embora não explicite isso, quer parecer que a citada decisão parte do pressuposto que o fundamento legal para a configuração de responsabilidade tributária de grupos econômicos de fato seria o artigo 50 do Código Civil, e não o artigo 124, inciso I do CTN. Por fim, no âmbito da 2ª Seção do Carf, convém destacar o Acórdão 9202­-006.946, da Câmara Superior de Recursos Fiscais. Segundo o entendimento lá esposado por maioria de votos, na hipótese de grupo econômico, a responsabilização poderia pautar-se em um dos dois incisos do artigo 124 do CTN. Na hipótese de fundamentação com base no inciso I do citado prescritivo legal, o ônus probatório quanto à existência de um interesse comum seria do Fisco, o que, no caso em julgamento, não teria ficado provado. Por sua vez, tal responsabilização também poderia fundar-se no inciso II do artigo 124 do CTN, o que demandaria a conjugação de tal dispositivo com o prescrito no artigo 30, inciso IX da Lei 8.212/91. Nesta hipótese, segundo maioria do colegiado, a fiscalização estaria desonerada de provar a existência do citado “interesse comum”, seja qual for o seu conteúdo. Da análise dos sobreditos julgados é possível constatar que a discussão ainda é dividida no Carf e que poderia ser assim delimitada: parte do tribunal entende que para a configuração de “interesse comum” bastaria a existência de um interesse econômico por parte do responsabilizado na ocorrência do fato gerador do tributo; por sua vez, parcela do tribunal entende que não bastaria a existência de um interesse econômico, cobrando, pois, a existência de um interesse jurídico, o qual poderia ser configurado pela existência de uma confusão patrimonial ou mesmo uma coparticipação na realização do fato gerador do tributo; e, por fim há ainda uma terceira corrente que admite a possibilidade desta responsabilização com a supressão desta discussão (interesse econômico x interesse jurídico), desde que a exigência fiscal tenha se pautado no artigo 124, inciso II do CTN, c.c. o artigo 30, inciso IX da Lei 8.212/91. Tal divergência jurisprudencial, embora não seja desejável para fins de segurança jurídica, é em certa medida compreensível, já que se trata de um tema bastante complexo e até hoje muito debatido tanto no âmbito doutrinário quanto na seara judicial. *Este texto não reflete a posição institucional do Carf, mas, sim, uma análise dos seus precedentes publicados no site do órgão, em estudo descritivo, de caráter informativo, promovido pelos seus colunistas.   Autor: Diego Diniz Ribeiro Fonte: Conjur

08 de Julho de 2019

Anac vai distribuir "slots" da Avianca

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou na sexta-feira que retomou o plano de redistribuição dos horários de pousos e decolagens ("slots") que estavam em uso pela Avianca Brasil nos aeroportos de Guarulhos, Santos Dumont e Recife. O órgão regulador acrescentou que a redistribuição dos slots nesses aeroportos será feita de acordo com as regras vigentes. Pela legislação atual, a agência distribui metade dos slots para empresas aéreas que já atuam nos aeroportos. A outra metade é dividida igualmente entre novos competidores. São considerados novos concorrentes empresas com até 5 slots diários no aeroporto. Na quinta-feira, o juiz Ricardo Negrão, da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, suspendeu a liminar que impedia a Anac de redistribuir os slots da Avianca Brasil. Em 28 de junho, o juiz João de Oliveira Rodrigues Filho, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais, havia proibido a agência de fazer a distribuição dos slots, sob o argumento de que, sem eles, a Avianca não teria ativo relevante para vender no leilão de recuperação judicial, marcado para 10 de julho. Em relação aos slots que estavam em uso pela Avianca Brasil no aeroporto de Congonhas, a Anac informou que aguardaria até ontem contribuições de interessados para concluir um estudo sobre o tema. A agência anunciou no dia 24 de junho a abertura de um processo de tomada de subsídios (consulta pública), para ouvir interessados na redistribuição de slots da Avianca antes decidir sobre o assunto. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) emitiu nota técnica pedindo à Anac que altere as regras de alocação de slots para evitar a concentração de mercado, especificamente no aeroporto de Congonhas (SP). O Cade sugeriu que o limite para uma aérea ser definida como nova entrante suba de 5 slots para 60 slots por dia - o que beneficiaria a Azul - e que 100% dos slots da Avianca fossem distribuídos para novos entrantes. Na semana passada, a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata) encaminhou à Anac um documento em que se mostra contrária às recomendações dadas pelo Cade à agência. Para a Iata, a redistribuição deve seguir a regra atual, que também é usada em outros países, de acordo com a entidade. Esse posicionamento tem sido defendido por Gol e Latam. Em meio à polêmica, uma fonte próxima à Avianca Brasil afirmou que o leilão de ativos da companhia, marcado para quarta-feira está mantido. De acordo com a fonte, que preferiu manter seu nome em sigilo, a companhia fará o leilão das 7 unidades produtivas isoladas (UPIs), que incluirão os slots que estavam em uso pela Avianca nos aeroportos de Guarulhos, Congonhas e Santos Dumont, "sub judice". Ou seja, a transferência dos slots para os compradores das UPIs dependerá de uma decisão da Justiça.   Autor:  Por Cibelle Bouças Fonte:  Valor Econômico | Empresas

04 de Julho de 2019

A recuperação judicial do produtor rural e a mudança da percepção do mercado

O Conselho da Justiça Federal aprovou recentemente 34 enunciados durante a III Jornada de Direito Comercial, dentre os quais o 97, com a seguinte redação: “ENUNCIADO 97 – O produtor rural, pessoa natural ou jurídica, na ocasião do pedido de recuperação judicial, não precisa estar inscrito há mais de dois anos no Registro Público de Empresas Mercantis, bastando a demonstração de exercício de atividade rural por esse período e a comprovação da inscrição anterior ao pedido”. Como é de conhecimento do setor do agronegócio brasileiro, o crédito rural oferecido pelo sistema bancário sempre representou uma parcela pequena do financiamento do produtor, que precisa contar com capital próprio e o financiamento por meio das operações de barter e venda antecipada de suas lavouras para trading companies, usinas e outros offtakers. Esses financiadores privados obviamente analisam sua exposição de risco ao conceder o crédito ao produtor, levando em consideração o grau de endividamento do mesmo, as garantias de cumprimento das obrigações contratuais oferecidas por ele e o custo de uma eventual medida judicial para perseguição do crédito. Em relação a este último item, o custo para a cobrança judicial do crédito e o fato de que, para o credor, o produtor rural pessoa física não teria acesso à recuperação judicial senão mediante sua inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis e após o exercício da sua atividade sob aquele registro resultava em uma percepção mais favorável para a concessão do crédito. De fato, a exigência de exercício da atividade por tal lapso temporal mínimo de dois anos justifica-se para evitar surpresa para o credor e oportunismo de empresas recém-constituídas que, com reserva mental, contraiam um endividamento já imaginando buscar, na sequência, os benefícios da recuperação judicial. Nesse sentido, a utilização do registro como termo inicial para a contagem de tal prazo é de rigor e não deveria ser excluído para o produtor. A despeito do enunciado já mencionado, esse tema ainda será objeto de debate no STJ. No cerne dessa discussão está a natureza do registro público de empresas, se meramente declarativo, como querem os advogados que vêm atuando em favor da inclusão dos débitos anteriores ao registro na recuperação judicial, ou se de natureza constitutiva, na medida em que constituiria o marco legal a partir do qual o prazo do exercício da atividade empresarial deveria ser contado. Neste cenário, o entendimento expressado pelo Enunciado 97 acaba dando sustentação ao movimento de alguns produtores que tomou de surpresa o mercado do agronegócio e certamente terá impacto nas futuras concessões de crédito. Importante salientar que, nesse mercado, renegociações de dívidas diretamente com os credores sempre foi algo comum, na medida em que as relações entre offtakers e produtores se renovam a cada safra, e a relação entre essas partes sempre foi simbiótica. No passado, um movimento semelhante de judicialização dos contratos de compra antecipada de soja, chamados no mercado de “contratos soja verde”, acabou por produzir uma forte retração nas operações de financiamentos dos produtores. O que ocorreu naquela ocasião foi que as safras de 2002/2003 e 2003/2004 foram particularmente problemáticas, e o preço da saca de soja no mercado spot disparou, criando uma diferença significativa em relação aos preços previamente definidos nos contratos de compra e venda antecipada. Alegando onerosidade excessiva, fato do príncipe, desequilíbrio contratual, entre outros argumentos, alguns agricultores, especialmente no estado de Goiás, promoveram disputas judiciais sobre o tema e encontraram uma resposta favorável do Poder Judiciário. A consequência imediata foi a redução em 44% de novos contratos de soja verde na safra seguinte, 2004/2005, ainda que a queda nos contratos de barter e outras modalidades de contratos de financiamento tenham reduzido significativamente menos. A consequência de redução de novos contratos é natural e decorre da percepção do mercado de um risco maior de o produtor não cumprir com sua obrigação contratual, seja entregando soja, por exemplo, seja dificultando a execução das garantias contratuais. Ainda que a parcela de produtores que efetivamente busquem alternativas ao não cumprimento dos contratos seja pequena (como foi em 2003/2004), o que acaba prevalecendo é a percepção do mercado de aumento de risco, prejudicando diretamente os produtores adimplentes. Essa mudança da percepção do mercado, aliada às possíveis restrições ao crédito que o novo plano de safra possa trazer, será um cenário catastrófico para o agronegócio brasileiro.   Autor:  Frederico Favacho Fonte:  Consultor Jurídico



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