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Fisco pode suspender execução fiscal e ser credor em insolvência

17/11/2021

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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu pela primeira vez, com base na nova Lei de Recuperação Judicial e Falências, sobre a possibilidade de a Fazenda Pública fazer parte do processo de insolvência das empresas com dívidas fiscais. O julgamento ocorreu na 4ª Turma da Corte.

Esse tema foi analisado por meio de um recurso apresentado pela Fazenda Nacional contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que determinava a extinção da ação de execução fiscal (REsp nº 1.872.153).

O resultado, portanto, é favorável ao Fisco. Se tivesse que desistir da execução fiscal, ficaria impedido de apurar a responsabilidade dos sócios da empresa e, se for o caso, pedir o redirecionamento da cobrança para eles.

A 4ª Turma julga questões de direito privado. Nas turmas de direito público, no entanto, também existem decisões sobre o assunto. Em diversos processos, a Fazenda Nacional obteve o direito de optar pelas duas vias de cobrança: a execução fiscal e a habilitação do crédito na falência.

A 1ª Seção, responsável por pacificar as questões de direito público no STJ, prevê julgar esse tema amanhã em caráter repetitivo - que vincula a 1ª e 2ª Turmas do STJ e instâncias inferiores do Judiciário. A discussão ocorrerá por meio de três recursos especiais (nº 1.872.759, nº 1.981.836 e nº 1.907.397).

Há uma certa confusão na Corte sobre quais turmas têm competência para julgar essa matéria. O tema foi encaminhado para a 1ª Seção pelo ministro Moura Ribeiro - que atua na outra Seção, de direito privado.

“A competência da 1ª Seção, pois, nos termos do regimento interno desta Corte Superior, esse é o órgão julgador competente para processar e julgar recursos relativos a tributos e direito público em geral”, disse o magistrado ao analisar um desses casos, no mês de fevereiro.

Os ministros da 4ª Turma, porém, ao julgarem, agora, o mesmo tema - e proferirem a primeira decisão do STJ com base na nova lei - afirmam que a Corte Especial decidiu em duas oportunidades, no ano de 2012 e em 2020, que a competência para julgar casos que envolvam o juiz da recuperação judicial e o juiz da execução fiscal é das turmas de direito privado.

Essa confusão em torno da competência das turmas existe porque os recursos podem vir dos dois lados. Os processos de falência tramitam nas varas e câmaras empresariais. Se o Fisco tentar habilitar o crédito e receber uma resposta negativa, irá recorrer ao STJ e esse recurso será encaminhado para as turmas de direito privado - 3ª e 4ª.

Já as ações de execução fiscal tramitam nas varas de Fazenda Pública. Se a devedora apresentar recurso contra uma decisão proferida nesses processos, esse recurso será direcionado, no STJ, para as turmas de direito público - 1ª e 2ª.

A Fazenda Nacional pleiteava, na 4ª Turma, a inclusão de R$ 1,2 milhão no processo de falência da Sociedade Saúde ABC (REsp nº 1.872.153). Afirmou, no recurso, que a execução fiscal não foi "uma escolha". Quando proposta, a falência da empresa ainda não havia sido decretada. Além disso, informou, não existe penhora ou qualquer outra garantia válida nessa ação - que encontra-se suspensa.

O procurador Gabriel Bahia, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) sustentou, durante o julgamento, que exigir uma escolha por parte do Fisco - a execução fiscal ou a habilitação do crédito na falência - poderia levar à frustração do recebimento do crédito público.

“Existem dois cenários possíveis. Caso tenha que desistir da execução fiscal, a Fazenda Pública ficaria impedida de perseguir eventuais corresponsáveis, por outro lado, se impedida de habilitar o seu crédito na falência estaria bloqueada a possibilidade de perseguir o seu crédito em face da falida”, disse.

Os ministros da 4ª Turma do STJ atenderam o pedido da PGFN. Determinaram a inclusão do crédito no processo de falência sem exigir renúncia à execução fiscal com base no artigo 7-A da Lei nº 11.101, de 2005, que foi recentemente alterada pela Lei nº 14.112, de 2020. As novas regras já estão em vigor desde o dia 23 de janeiro.

Esse dispositivo estabelece um procedimento específico, chamado “incidente de classificação do crédito público”, a ser instaurado pelo juiz da falência.

Consta que o magistrado enviará um ofício para cada Fazenda Pública credora e determinará prazo de até 30 dias para que apresente diretamente ao administrador judicial ou em juízo - a depender do momento processual - a relação completa dos créditos inscritos em dívida ativa, acompanhada dos cálculos, da classificação e das informações sobre a situação atual.

O inciso V desse artigo diz expressamente que “as execuções fiscais permanecerão suspensas até o encerramento da falência, sem prejuízo da possibilidade de prosseguimento contra os corresponsáveis”.

“Ficou autorizada a habilitação do crédito fiscal na falência, desde que, em contrapartida, tenha ocorrido a suspensão das execuções fiscais, exatamente para evitar a sobreposição de formas de satisfação e incorrer no óbice da dúplice garantia”, afirmou o relator do caso na 4ª Turma, ministro Luis Felipe Salomão, ao proferir o seu voto.

No processo de falência, portanto, segundo o ministro Salomão, discute-se o recebimento do crédito. Já nas ações de execução fiscal trata-se da existência, exigibilidade e valor do crédito - além de eventual prosseguimento da cobrança contra os corresponsáveis.

Para Ricardo Siqueira, do escritório RSSA Advogados, especialista na área de insolvência, não faria sentido permitir que a execução fiscal ocorra de forma plena. “Porque existe uma ordem legal de preferência de pagamento que tem de ser respeitada na falência”, diz. “Está no artigo 83 da lei. Primeiro o crédito trabalhista, segundo os credores com garantia real e em terceiro aparece o Fisco. Não pode burlar essa fila”, acrescenta.

Mesmo que o Fisco conseguisse penhorar bens da empresa falida, diz o advogado, os valores não poderiam ser usados para satisfazer a execução. Teriam de ser entregues ao juiz da falência para o pagamento conforme a ordem de prioridade.

 

Fonte: Valor econômico 

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